Carlos Ramalho

Presidente do Sindicato Democrático dos Enfermeiros de Portugal (SINDEPOR)

Os enfermeiros são resilientes mas dispensam tanta ingratidão

12 de Maio de 2021

A pandemia de covid-19 aumentou o reconhecimento público dos enfermeiros. Os elogios não faltaram. A valia da nossa profissão é salientada por todos, pela coragem, empenho e competência com que enfrentamos uma doença devastadora. Um combate duro e desigual que muito nos desgastou e reclama repouso. Mas não repousamos. Superamos a fadiga, continuamos em frente e voltamos a provar que Portugal pode contar connosco, ao assumirmos um papel fundamental na vacinação dos portugueses. Com a habitual competência que nem o cansaço apaga.

Neste Dia Internacional do Enfermeiro ainda recordamos o eco – já algo longínquo, é certo – das palavras dos governantes que nos chamaram “heróis”. Um elogio que não pode ser mais falso. Por norma, um país que se preze trata bem os seus heróis. Acarinha-os como eles merecem. Trata-os como verdadeiros heróis. Mas, como todos já perceberam, não é isso que se passa em Portugal. Continuamos a ser tão desprezados como sempre fomos.

Os enfermeiros começam a escassear no nosso país. Poderá pensar-se que estamos perante uma profissão de pleno emprego ou quase. Não. O problema é mais complexo. Na verdade, as baixas remunerações estão a provocar um enorme êxodo de enfermeiros rumo a outros países, onde, com facilidade, encontram melhor compensação pelo seu trabalho. Aí, rapidamente progridem e atingem lugares de destaque, em detrimento dos nativos, graças ao seu alto grau formativo (que tanto custa ao erário público).

Mesmo em fase de pandemia, com o aumento de “oportunidades” em Portugal e com toda a incerteza ligada à Covid-19, cerca de 1300 enfermeiros portugueses optaram por emigrar. Um número que dá que pensar.

Pode considerar-se que o facto de os enfermeiros emigrarem em massa não tem qualquer impacto na saúde dos portugueses. O problema é que tem. A falta de profissionais de enfermagem degrada a qualidade dos cuidados prestados aos portugueses, enquanto a mesma melhora nos países para onde os competentes enfermeiros lusos emigram.

O Dia Internacional do Enfermeiro podia ser um motivo de festa mas, infelizmente, não temos motivos para isso. A enfermagem é uma profissão penosa, pelos conhecimentos, resiliência e capacidades físicas e mentais que exige. E a sua penosidade aumentou muito com a pandemia. A falta da devida compensação por todo este esforço só faz dos enfermeiros portugueses profissionais desmotivados e a sentirem cada vez mais o peso das injustiças que todos os dias desfilam à frente dos nossos olhos.

Este texto foi publicado na edição de 12 de Maio do jornal Diário de Coimbra.