Pagamento do subsídio COVID é cada vez mais uma miragem

O SINDEPOR acusa o Hospital Fernando Fonseca, na Amadora, de dificultar, ainda mais, o pagamento do subsídio extraordinário de risco covid-19. Neste estabelecimento, para se poder ter direito ao referido suplemento de remuneração é preciso cumprir o que chamam de “conceito de permanente – mais de 50% do tempo normal de trabalho (diário e mensal) exposto ao risco covid em áreas dedicadas”.

Na legislação que define o subsídio de risco extraordinário covid-19 (artigo 291º da Lei 75-B/2020 e Portaria 69/2021) não existe menção explícita a ser necessário ter que trabalhar no mínimo 50% do mês em áreas covid-19. O SINDEPOR defende que, se o legislador quisesse introduzir esta condição, tê-lo-ia feito expressamente, da mesma forma que definiu o teto máximo deste subsídio em 50% do IAS.

Mais, no esclarecimento prestado aos conselhos de administração hospitalares, pela Administração Central do Sistema de Saúde, fica claro: “Afigura-se-nos que o facto de os trabalhadores estarem em escala não colide com a eventual consideração de que estão a exercer as funções de forma permanente e maioritária, devendo o subsídio extraordinário de risco ser calculado de forma proporcional ao tempo adstrito à execução destas funções.”

Na maior parte dos hospitais, os enfermeiros recebem o subsídio covid-19, mesmo que só tenham trabalhado um dia por mês em área dedicada à pandemia, sendo-lhes pago o valor referente a esse dia (que rondará, na maior parte dos enfermeiros, cerca de 8 euros/dia). De facto, o risco continua a existir por os enfermeiros estarem em contacto com doentes infetados, independentemente de ser uma hora, um dia ou um mês

Um enfermeiro que trabalhe, por exemplo, no Alentejo e noutras regiões do país, pode receber apenas um dia de trabalho com doentes covid-19. Mas, como o SINDEPOR já denunciou, se se tratar de um enfermeiro do Centro Hospitalar e Universitário do Algarve (CHUA), já tem de ter estado pelo menos 50% do mês de trabalho em serviço covid-19 para ter direito ao subsídio, conforme decisão do respetivo conselho de administração.

A decisão do CHUA é iníqua, mas a do Hospital Fernando Fonseca leva a injustiça ainda mais longe, ao exigir “diário e mensal”. Ou seja, no limite, um enfermeiro até pode estar um mês inteiro em serviço covid-19, mas se apenas trabalhar três horas por dia no combate à pandemia, já não recebe subsídio. Tendo em conta as situações que o SINDEPOR conhece, esta exigência de 50% de serviço, ao mês e ao dia, verifica-se apenas na Amadora.

“O cidadão espera que as leis sejam aplicadas de forma uniforme em todo o país, mas não é isso que acontece. Este subsídio, já de si restritivo, ficou refém dos conselhos de administração e alguns criaram artifícios para não o pagarem. Uma arbitrariedade totalmente inadmissível, que não nos cansaremos de denunciar”, vinca Carlos Ramalho, presidente do SINDEPOR. “No fundo estamos perante um estratagema para pagarem o menos possível e ao menor número de profissionais”, acusa. “Como é possível chamarem heróis aos enfermeiros pela nossa entrega no combate à pandemia e depois tratarem-nos assim?”, questiona ainda o líder sindical, voltando a apelar “à intervenção do primeiro-ministro e da ministra da Saúde para que se anulem estas desigualdades”.

Mas os problemas com o subsídio de risco covid-19 não se ficam por aqui. Por exemplo, os enfermeiros do Hospital Fernando Fonseca ainda não receberam o pagamento referente aos meses de janeiro e fevereiro. Nalguns estabelecimentos, o subsídio foi pago no final de março, noutros no final de abril e, no caso do estabelecimento da Amadora, os profissionais de saúde acreditam que lhes será pago no final de maio.

Outra injustiça, verificada no hospital da Amadora, prende-se com enfermeiros que trabalham em zonas classificadas como “limpas” – pelo que não tem direito ao subsídio covid-19 –, mas, na prática, acabam por tratar pessoas infetadas. Tomemos como exemplo a urgência de obstetrícia do Fernando Fonseca. Desde o início do ano e até 25 de março foram feitos 44 partos a grávidas infetadas com covid-19. Deste total, 24 entraram na zona limpa e 20 na área covid. Ou seja, quem na realidade tratou mais grávidas infetadas com covid-19 não tem direito ao subsídio.

Tendo em conta que pelo menos um estudo científico indica que, em Portugal, houve mais profissionais de saúde infetados com covid-19 em áreas não dedicadas à doença, desde logo porque a proteção dos profissionais é menor, o SINDEPOR defende a atribuição deste subsídio de risco extraordinário a todos os enfermeiros. Mais: o SINDEPOR vai continuar a lutar pela criação de um subsídio de risco permanente, e não extraordinário, para todos os enfermeiros, tendo em conta as caraterísticas e a penosidade da profissão.